FNDC repudia mudanças nas regras do Facebook e do Instagram
O Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) divulgou uma nota nesta semana manifestando repúdio às alterações nas regras das redes sociais Facebook e Instagram. A principal delas é o fim do programa de checagem de fatos. A decisão foi comunicada em pronunciamento em vídeo de Mark Zuckerberg, presidente-executivo da Meta, que controla as duas plataformas.
Criada em 1991, a FNDC congrega entidades da sociedade civil brasileira engajadas na discussão da democratização da comunicação. De acordo com a nota divulgada, as medidas adotadas pela Meta representam um ataque direto à proteção de direitos individuais e coletivos no ambiente digital, ao promover a desinformação e ampliar a margem para discursos de ódio.
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Ao anunciar a decisão, Zuckerberg fez acenos à Donald Trump, eleito presidente dos Estados Unidos. Crítico da checagem dos fatos, Trump tomará posse no dia 20 de janeiro. Mark Zuckerberg disse que a eleição de Trump é um ponto de inflexão e assumiu argumentos encampados por ele e por outros líderes mundiais de extrema-direita, que classificam a checagem de fatos como censura. “É hora de voltar para nossas raízes de livre expressão no Facebook e no Instagram”, acrescentou.
A checagem de fatos tem como objetivo detectar e apontar erros, imprecisões e mentiras nas postagens. Na prática, a mudança anunciada pela Meta significa que não será mais realizado nenhum trabalho para confirmar e comprovar informações veiculadas pelos usuários do Instagram e do Facebook. Zuckerberg afirmou que será adotado um modelo de notas da comunidade, similar ao da plataforma X controlada pelo empresário Elon Musk. Através dele, os próprios usuários podem agregar informações contestando a veracidade de determinada conteúdo.
O presidente-executivo da Meta ainda acusou governos e veículos da mídia tradicional de serem favoráveis à censura. Zuckerberg também anunciou outras mudanças envolvendo moderação de conteúdo, como a redução no utilização de filtros que buscam por conteúdos que violam os termos de uso. “É uma troca. Significa que vamos mapear menos coisas ruins, mas também vamos reduzir o número de postagens de pessoas inocentes que derrubamos acidentalmente”, disse.
Liberdade irrestrita
A posição de Zuckerberg é duramente criticada na nota da FNDC. “Sob o pretexto de defender uma suposta liberdade de expressão irrestrita, a Meta anunciou o desligamento de filtros de moderação de conteúdo relacionados a temas sensíveis como imigração e gênero, assim como o enfraquecimento de iniciativas de checagem de fatos, o que contribui para a proliferação de fake news e, consequentemente, reforça conteúdos que promovem a extrema-direita, colocando em risco a democracia, a liberdade de expressão responsável e o próprio tecido social”, diz a nota.
Para o FNDC, a decisão sinaliza uma ofensiva da Meta contra esforços internacionais de regulação das big techs, como são chamadas empresas responsáveis pelas plataformas digitais. Foram mencionadas discussões em curso no Brasil, na Alemanha e na China.
“Essa postura revela as big techs como verdadeiras ferramentas geopolíticas que visam desestabilizar a ordem internacional O anúncio da Meta não se limita a uma nova política de moderação de conteúdo, mas configura um movimento político que ameaça a integridade das democracias em todo o mundo. Ao alinhar-se às ideias de Donald Trump, Elon Musk, e outros representantes da extrema-direita, a Meta reforça uma agenda política destrutiva internacional, com objetivo de fragilizar as instituições democráticas e a justiça social, e concentrando ainda mais poder político e econômico nas mãos de poucos, preferencialmente, nos Estados Unidos”, acrescenta o texto.
A nota cobra ainda uma resposta robusta e imediata. “É imprescindível que governos democráticos e organizações da sociedade civil de todos os países intensifiquem os esforços para regular as plataformas digitais, a fim de garantir um ambiente online mais justo, seguro e respeitoso, livre de manipulação, desinformação e ódio”.
“Regulação não é censura, mas um mecanismo essencial para defender as pessoas e proteger as democracias, preservando os direitos humanos e a liberdade de expressão responsável”, diz a nota.
Regulação de conteúdo
O pronunciamento de Zuckerberg também gerou reação dentro do governo federal. João Brant, secretário de Políticas Digitais da Secretaria de Comunicação (Secom), classificou como uma declaração explícita de que a Meta não aceita a soberania dos países sobre o funcionamento do ambiente digital. Em meio à repercussão do anúncio, o Ministério Público Federal (MPF) decidiu, nesta quarta-feira (8), oficiar a Meta para se explicar sobre as mudanças. Foraom concedidos 30 dias úteis de prazo para manifestação. O MPF quer entender se as novas regras podem impactar direitos dos usuários brasileiros do Facebook e do Instagram.
Preocupações também foram ecoadas por lideranças europeias. Entre elas, o ministro alemão dos Assuntos Digitais, Volker Wissing. Ele afirmou que a questão será examinada cuidadosamente e defendeu a necessidade de garantia de informação segura e verificada. Thomas Regnier, porta-voz da Comissão Europeia, negou nesta quinta-feira (9) que governos europeus pressionem por censura. Ele afirmou que a Lei de Serviços Digitais não forçou e nem solicitou que as plataformas da Meta removessem conteúdo legal e, sim, aqueles que pudessem ser nocivos para crianças ou para o andamento das democracias da União Europeia.
Em uma publicação nas redes sociais, o alto comissário da Organização das Nações Unidas (ONU) para os direitos humanos, Volker Türk, afirmou que regulação de conteúdo não é censura. “Permitir discurso de ódio e conteúdo prejudicial online tem consequências no mundo real. Regular tal conteúdo não é censura. Meu gabinete pede responsabilidade e governança no espaço digital, em linha com os direitos humanos”, registra a postagem compartilhada nesta sexta-feira (10).
Nos Estados Unidos, onde as mudanças já foram aplicadas, manifestações com insultos homofóbicos, xenófobos e misóginos, antes filtradas, passaram a ser liberadas. As novas regras permitem, por exemplo, que os usuários associem a homossexualidade ou a transsexualidade à doenças mentais, apesar do consenso científico rejeitar esse tipo de tese.
No Brasil, a regulação das big techs já é tema de um projeto de lei que ficou conhecido como PL das Fake News, atualmente em tramitação no Congresso Nacional. Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) também já manifestaram publicamente preocupações com a questão. No fim do ano passado, a corte começou a julgar ações na qual se discutem se as plataformas digitais devem ser responsabilizadas por conteúdos de usuários caso deixem de tomar as providências necessárias para remover postagens com teor criminoso.